terça-feira, 19 de abril de 2016

Sete Dias de Tortura - 1 de 7

A explicação do porquê de estar fazendo esta série está AQUI.

Por favor, leiam até o final, se conseguirem. Boa leitura!

Tortura de Crimeia, Danielli, César, Maria Amélia, além de seus filhos Janaína e Edson, de 5 e 4 anos respectivamente, na época.

Tortura de Maria Amélia

"Distribuíam choques nos ouvidos, na boca, nos tornozelos, nos seios, no ânus, na vagina. Numa ocasião caí numa cama de campanha, semi acordada. Um dos torturadores aproveitou-se para esfregar-se em mim, masturbando-se, jogando esperma. Poderia haver algo pior? Sim. Poderia. Durante as sessões de tortura, enquanto eu estava no pau-de-arara aplicavam-me injeções nas nádegas que diziam ser "soro-da-verdade" e jogavam pequenas quantidades de coca-cola em minhas narinas dizendo que era para matar a sede."

Entre uma sessão de tortura e outra ela ouvia os gritos de seu marido César e de seu amigo Danielli (posteriormente executado)

Tortura de César

César conta que foi despido e os torturadores batiam em suas costas com palmatória, davam choque por todo o corpo: tornozelos, pulsos, os dedos indicadores, dedão do pé. Em seguida foram intensificando mais as torturas. Ele foi amarrado na "cadeira do dragão", local em que levou choques nos ouvidos, boca, umbigo, além de golpes nos braços, pernas e pés.

"Davam tapões nos meus ouvidos e chamavam a isto de telefone. Em algumas vezes cheguei a perder os sentidos."

Algumas sessões eram acompanhadas por um médico que, vez por outra media sua pressão, auscultava seu coração e dizia: "Pode continuar, ele aguenta."

Maria Amélia entrou em estado de choque psíquico, César entrou em estado de coma.

No dia seguinte à prisão de César e Maria Amélia, a polícia prendeu as crianças Janaína e Edson e sua tia Crimeia. As crianças assistiam a Vila Sésamo nesse momento. Os três (incluindo as crianças) foram conduzidos numa viatura policial sob a mira de uma metralhadora.

Os policiais só foram se dar conta de quem era Crimeia, alguns dias depois. Ela se apresentou como babá das crianças. Mesmo assim eles a levaram. Mesmo sem saber quem era.

Ao encontrarem César e Maria Amélia, saindo da sala de tortura, ambos tinham esquimoses por todo o corpo, estavam sujos e suados. O menino Edson, de 4 anos, perguntou:

"Por que vocês estão verdes?"

Crimeia foi levada para uma cela, enquanto as crianças ficavam perambulando pelos corredores do local, sendo testemunhas de gritos de dor dos presos políticos, além de serem usadas como instrumento de tortura psicológica dos seus pais.

Tortura de Crimeia

Crimeia foi interrogada sem sofrer tortura física a princípio, mas diante de seu amigo Danielli, ainda vivo, mas moribundo.

"Mesmo não sendo torturada fisicamente, o sofrimento era grande pois insistiam para que eu reconhecesse um amigo, Carlos Nicolau Danielli, dirigente do Partido Comunista do Brasil, preso juntamente com minha irmã (Maria Amélia) e meu cunhado (César). Fui levada à sala de tortura que ficava embaixo, junto à escada onde o vi estirado no chão, com o corpo coberto de esquimoses, edemaciado, inconsciente."

Crimeia foi então indentificada e, mesmo grávida de 7 meses, passou a ser torturada fisicamente.

Pela manhã, o próprio coronel Brilhante Ustra, enaltecido por Jair Bolsonaro, foi pessoalmente retirá-la da cela. Os espancamentos começaram, principalmente no rosto e na cabeça. Choques elétricos nos pés e nas mãos. Murros na cabeça enquanto descia a escada encapuzada. Palmatória de madeira nos pés e nas mãos. Por recomendação de um torturador que se dizia médico, devido a gravidez, deveriam ser evitados espancamentos no abdômen.

Crimeia chegou a ficar 36 horas seguidas de interrogatório, enquanto os interrogadores faziam rodízio.

"Eu era colocada no carro do meu cunhado e diziam que iriam me levar até a Serra dos Araras onde eu seria assassinada e o carro incendiado e empurrado para o precipício. Várias noites passei no pátio da OBAN, dentro deste carro, e, quando amanhecia, me levavam de volta à cela."

"Se meu filho nascesse vivo, seria sequestrado por eles ou confinado na FEBEM. Eu e minha irmã fomos torturadas várias vezes para que assinássemos um papel em que consentíamos que eles fizessem o aborto."

"Todos os interrogatórios foram feitos após tirarem todas as minhas roupas, inclusive as mais íntimas."

Além de torturarem Crimeia, torturaram em sua frente a sua irmã sob a alegação de que estavam agindo desta forma porque "eram bonzinhos por não pendurarem no pau-de-arara mulher grávida.". Diziam que Crimeia não estava sendo boazinha, pois deixava que a irmã fosse torturada" e que pior, diziam que "só estava sendo durona porque era sua irmã que estava sofrendo a tortura e não ela".

Crimeia foi transferida para uma cela improvisada, sem ventilação e instalações sanitárias, ali permaneceu vários dias sem ser interrogada.

"A porta era aberta três vezes ao dia, por 10 minutos, quando eu podia satisfazer minhas necessidade fisiológicas, beber água e tomar banho. Ao final desse tempo me era dada refeição. Esse tempo nunca foi suficiente e, por isso, muitas vezes fiz as necessidades fisiológicas no chão da própria cela e nenhum dia consegui tomar banho."

Durante todo o período de tortura, Crimeia e seu filho, ainda no útero, apresentaram soluços. Nela a duração dos soluços era mais curta. Para o nascituro, os soluços persistiam pela noite inteira e adentravam o dia.

"O único cuidado que eu podia lhe dar era massagear de leve a minha barriga. Isto me causava muita angústia. Esse soluço acompanhou meu filho por algum tempo depois de ter nascido, bastava ouvir os gritos ou os barulhos mais estridentes."

Uso das crianças como tortura

Após serem separadas da tia, as crianças Edson (4 anos) e Janaína (5 anos) foram testemunhas dos gritos de dor dos presos políticos sendo torturados e, principalmente, do rosto transfigurado de sua mãe, a qual somente foi reconhecida por Edson quando este ouviu-a chamá-lo. Quando olhou para o rosto da mãe não conseguiu identificá-la, tal a deformação provocada pelas esquimoses.

Edson: "Horrível sensação de estar diante de alguém que conhecemos a voz, mas não há identificação com o corpo, que a esta altura estava roxo, com hematomas (...)"

Janaína: "Lembro-me claramente de me indicarem, entre corredores escuros, o lugar onde encontraria meus pais. Eles estavam numa sala escura sentados em uma mesa onde havia dois pratos de sopa, mal se mexeram quando viram a mim e a meu irmão. Estavam esverdeados ou amarelados e sem forças. Achei muito estranho, mas fiquei feliz em pular em seus colos, mesmo que eles mal conseguissem sorrir. Não me lembro sobre o que falamos, mas esta lembrança é muito marcante, nunca a esqueci. A falta de reação dos meus pais foi impressionante, eles sempre eram muito carinhosos. Naquele momento eles estavam inertes."

Os opressores a todo momento diziam aos pais que seus filhos também seriam torturados e mortos.

Maria Amélia (mãe): "Um dia eles foram buscar meus filhos Janaína e Edson. Colocaram-me na cadeira de dragão, toda urinada e suja de vômito e me exibiram para as crianças. Jamais esquecerei que Janaína perguntou-me: mãe, por que você está roxa e o pai verde?"

César (pai): "Meu filho de 4 anos, ao nos ver, eu e minha esposa torturados, perguntou-me: Por que vocês estão verdes? As crianças ficaram perambulando pelos corredores da OBAN durante alguns dias, vendo os presos, inclusive os pais, entrarem e saírem das salas de torturas e ouvindo seus gritos de dor. (...) Nós pudemos perceber que os policiais tentaram interrogar as crianças sobre as pessoas que frequentavam nossa casa. Mais tarde, um dos interrogadores comentou conosco que "os comunistas doutrinam até crianças, pois seus filhos não nos prestaram nenhuma informação."

Carlos Alberto Brilhante Ustra, o qual Bolsonaro prestou homenagem na câmara dos deputados CONFESSOU a respeito da prisão das crianças e sobre tê-las obrigado a presenciar as consequências das torturas sofridas por seus pais.

A morte de Danielli

O amigo da família Carlos Danielli, acabou morrendo em decorrência das torturas incessantes.

César: "Nesse meio tempo e até o 4º dia, Nicolau Danielli continuou sendo torturado barbaramente e, a medida que o tempo passava, seus gritos se transformavam em lamentos e, finalmente, constatamos o seu silêncio, apesar de que ouvíamos barulho de espancamentos. No 5º dia, foram apresentados a mim e a minha esposa manchetes de jornais que anunciavam a morte de Danielli, como tendo tombado num tiroteio com agentes policiais. Sob os nossos protestos de que ele havia sido morto como consequência e ao cabo de torturas que sofreu na OBAN, fomos ameaçados de ter o mesmo destino.

Crimeia: "Fui levada à sala de tortura que ficava em baixo, junto à escada onde o vi estirado no chão, com o corpo coberto de esquimoses, edemaciado, inconsciente. Percebi que ainda respirava por uma espuma rosa que saía do canto da boca com um pequeno movimento e acabava por escorrer-lhe pelo rosto. A camisa estava aberta, as calças desabotoadas e abaixadas. Toda parte exposta do tórax e abdômen era uma imensa mancha roxa. À noite uma presa me disse que viu um homem ser levado morto para fora da cela. E, 1 ou 2 dias depois, me apresentaram um jornal com a manchete: "Terrorista morto em tiroteio".

Fonte desse texto e informações mais detalhadas do caso. Clique aqui.

Bem, por hoje é só. Amanhã voltarei com mais um relato deste belo período da nossa história. Serão 7 no total. 1 por dia. Por ora os deixarei com dois bônus. Até amanhã!

Bônus 1: Voto de Bolsonaro na sessão sobre o impeachment, homenageando Brilhante Ustra e parabenizando o bandido Eduardo Cunha. AQUI

Bônus 2: Vídeo de Bolsonaro que em 2 minutos defende a tortura, diz que a democracia não funciona, diz que fecharia o congresso no 1º dia como presidente e que mataria 30 mil pra terminar o trabalho que a ditadura não concluiu, começando por FHC. Ainda diz: "Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem." Não acredita que ela possa falar tanto absurdo em apenas 2 minutos? Então clique AQUI.

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